quarta-feira, 26 de novembro de 2025
A PRISÃO DE AUGUSTO HELENO HOJE NÃO É APENAS UM ACONTECIMENTO JURÍDICO
Beta Bastos
A prisão de Augusto Heleno hoje não é apenas um acontecimento jurídico.
É um marco histórico que expõe o esgotamento de uma mentalidade militar que atravessou décadas intacta, acreditando que nunca seria chamada a responder pelos próprios atos.
A queda do general revela mais sobre as estruturas que o formaram do que sobre sua biografia individual.
Heleno sempre representou o produto de uma formação castrense que se vê acima da sociedade civil, guardiã de uma nação imaginária, disciplinada à força e constantemente ameaçada por inimigos internos.
Sua trajetória, porém, não é feita apenas de discursos; é marcada por interferências políticas indevidas, desprezo por mecanismos democráticos e participação ativa na erosão institucional do país.
Ainda como comandante no Haiti, Heleno ganhou fama por sua postura agressiva e por declarações que beiravam o rompimento com protocolos diplomáticos.
De volta ao Brasil, tornou-se um dos generais mais vocalmente hostis ao processo democrático, atacou o Congresso, desqualificou a Constituição, defendeu “intervenção militar” e ajudou a alimentar a fantasia do militar como árbitro da República.
Foi um dos primeiros oficiais de alta patente a flertar publicamente com teses golpistas.
No governo Bolsonaro, sua atuação aprofundou esse histórico.
Como chefe do GSI, participou do ambiente que legitimou ataques ao STF, pressionou instituições de controle, alimentou teorias conspiratórias e blindou estruturas que operavam paralelamente do gabinete do ódio ao assédio sistemático contra jornalistas.
Heleno ajudou a transformar o Estado em trincheira ideológica, algo incompatível com qualquer democracia madura.
Quando o país mergulhou em polarização e ressentimento, Heleno não precisou mudar, o bolsonarismo apenas amplificou o que ele já carregava.
No governo, assumiu a postura simbólica do general-tutor, legitimando ataques às instituições, alimentando a retórica de conflito permanente e naturalizando a presença militar no centro do poder civil.
A prisão de hoje expõe o limite dessa fantasia tutelar.
Mostra que a democracia, mesmo ferida, ainda é capaz de impor responsabilidade, inclusive aos que sempre se imaginaram intocáveis.
Não se trata apenas de um general atrás das grades, mas do colapso de uma mentalidade que se acreditava acima das regras e da História.
Heleno simboliza a persistência de uma transição democrática incompleta.
Por décadas, parte da alta oficialidade envelheceu sem aceitar que o poder pertence ao povo, não aos quartéis.
Hoje, sua prisão sinaliza uma ruptura, a de que nem a nostalgia autoritária, nem o mito do “poder moderador”, nem a retórica da salvação militar são suficientes para blindar quem tentou corroer a ordem democrática.
Seu legado é estrutural, e sua queda também.
O Brasil está vendo, finalmente, que a democracia só se consolida quando aqueles que a ameaçam deixam de ocupar o lugar de intocáveis.A PRISÃO
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