"Não vai haver uma quartelada, o golpe já aconteceu em 2016", diz José Genoino
Ex-deputado federal fala sobre a politização dos fardados e a perigosa reação do STF aos ímpetos golpistas de Bolsonaro
16 de agosto de 2021, 19:48 h Atualizado em 16 de agosto de 2021, 20:23
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José Eduardo Bernardes, Brasil de Fato - José Genoino foi, durante muitos anos, um dos principais nomes do Partido dos Trabalhadores, principalmente por sua capacidade de articulação com seus pares. Eleito deputado federal em cinco mandatos consecutivos, de 1982 a 1998, pela sigla que ajudou a fundar, o cearense de Quixeramobim só deixou a vida legislativa para se tornar presidente do partido, em 2002.
Foi a impressionante capacidade de articulação que o levou ao Ministério da Defesa, em 2011, quando se tornou assessor especial de Celso Amorim, durante a gestão da ex-presidenta Dilma Rousseff.
O tempo que dedicou à aproximação com as Forças Armadas, lhe faz estranhar, ainda mais, os movimentos políticos que rondam a caserna atualmente, durante o governo de Jair Bolsonaro (sem partido).
“Eu tinha uma relação - quando eu era deputado e quando fui assessor do Ministério da Defesa - civilizada, sóbria com os militares e quero confessar que, pra mim, desde 2016, todos os fatos, até a passeata de tanques, é uma grande decepção”, diz.
Genoin deixou o mandato de deputado federal, em 2013 - obrigado a renunciar após sua condenação na Ação Penal 470, popularmente conhecida como Mensalão - e hoje se mantém ativo na articulação, mas desta vez com as bases do partido.
Eu tenho uma visão profundamente crítica do papel que os militares passaram a desempenhar a partir do golpe.
Ele avalia que o país não corre o risco de um golpe à moda antiga, mas ressalta que isso não quer dizer que estamos livres de uma onda importante de autoritarismo, com cada vez mais perda de direitos.
“Não é que vai haver uma quartelada, não é que vá haver uma espécie de golpe tradicional, porque o golpe já aconteceu em 2016, eu vou deixar isso claro. O que pode haver é uma espécie de endurecimento e de fechamento. Por exemplo, a lei anti-terror que está sendo discutida no Congresso, o Distritão, a lei de grilagem em terras públicas. São medidas que estão cumprindo uma sustentação política e estão definindo diretrizes do governo”.
Na entrevista para o Brasil de Fato, Genoino também fala sobre o Congresso Nacional e a queda da PEC do Voto Impresso, o Partido dos Trabalhadores e as posições políticas adotadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), para barrar os ímpetos golpistas de Bolsonaro.
“Eu acho que as iniciativas políticas da Câmara e do Senado estão aquem, como poder político deviam ter uma postura mais ofensiva, mais ousada, mais determinada. Eu acho que os poderes constituídos, cada um tem seu papel. Durante um certo tempo houve uma condescendência com o que estava acontecendo no Brasil. Nesse sentido, eu acho que nós não podemos ter ilusões (com o Supremo)”.
O senhor foi assessor especial do Ministério da Defesa e tem uma relação até próxima com os militares. Como tem acompanhado as recentes demonstrações políticas dos fardados? Na última semana, inclusive, a gente teve um desfile de blindados no Planalto, em frente ao Congresso e o STF, que ganhou tom de ridículo pela mídia internacional.
Eu tinha uma relação - quando eu era deputado e quando fui assessor do Ministério da Defesa - civilizada, sóbria com os militares e quero confessar que, pra mim, desde 2016, todos os fatos, até a passeata de tanques, é uma grande decepção. Eu tenho uma visão profundamente crítica do papel que os militares passaram a desempenhar a partir do golpe [contra a presidenta Dilma Rousseff]
Primeiro, eles foram peça importante no golpe. Segundo, a candidatura do atual presidente não seria viável sem eles, sem os tuítes, sem os dois “quatro estrelas” no gabinete do presidente do Supremo [Tribunal Federal - em relação aos militares convocados por Dias Tóffoli para atuarem como assessores da Corte, durante sua gestão], sem a intervenção no Rio de Janeiro, sem a participação da área de inteligência na própria campanha de 2018 e a participação deles como posição estratégica dentro do governo.
Portanto, há uma espécie de governo dos militares numa associação muito profunda com o atual presidente. Eu acho que essa demonstração política é mais ou menos dentro daquela lógica do atual presidente: crie uma situação de confronto, imagina um confronto e cria um inimigo.
Sempre foi assim, ele sempre trabalhou na política dessa maneira, cria um confronto e cria um inimigo. E as Forças Armadas estão cumprindo um papel que não tem nada a ver com a defesa nacional, que não tem nada a ver com as funções nobres do que significa Defesa Nacional.
As Forças Armadas estão cumprindo uma sustentação política e estão definindo diretrizes do governo.
Defesa Nacional é uma política de Estado, é uma política do país, é uma política que tem que ser discutida pela sociedade, é diminuir vulnerabilidades, é relação de boa vizinhança, é autonomia científica e tecnológica.
A Defesa Nacional para um país como o Brasil é, não de uma visão salvacionista do patriotismo, não é esta visão de quem entra para resolver e entraram e não resolveram no Ministério da Saúde. A Defesa Nacional não é cumprir lei e a ordem considerando o povo submetido, o povo fraco, não é essa relação preconceituosa com os políticos, em que a política é deslegitimada.
Eles assumem a mitologia da tutela, a mitologia da autonomia dentro do Estado, como se o Estado fosse fundado por eles, como se a pátria e a soberania existissem antes deles. Não é que vai haver uma quartelada, não é que vá haver uma espécie de golpe tradicional, porque o golpe já aconteceu em 2016, eu vou deixar isso claro.
O que pode haver é uma espécie de endurecimento e de fechamento, por exemplo, a lei anti-terror que está sendo discutida no Congresso, o distritão, a lei de grilagem em terras públicas.
É necessário aumentar a dimensão territorializada e capilaridade das manifestações e é necessário intensificar o movimento popular pelo fim desse governo, pela derrubada desse governo.
São medidas em que, além das econômicas, no caso de privatização dos Correios, a Eletrobras, além da questão da PEC 32 da reforma administrativa, as Forças Armadas estão cumprindo uma sustentação política e estão definindo diretrizes do governo.
Não é apenas um ministério, são vários ministérios, são vários cargos na direção das estatais, são vários cargos na área de comissionamento. Portanto, há uma militarização do Estado e essa militarização tem que ser enfrentada com a outra visão sobre Defesa.
Em primeiro lugar, subordinar os assuntos militares ao poder civil. Segundo, colocar a questão da Defesa como política pública. Terceiro, alterar esse conceito de lei e ordem que serve para tudo e os parâmetros de orientação estratégica sobre o papel das Forças Armadas no mundo.
O país está muito vulnerável. Quando a covid entra aqui, pega o país de cócoras e mata devido às políticas adotadas e não adotadas. 560 mil mortes, isso mostra que o país está inteiramente vulnerável. Defesa é diminuir vulnerabilidades.
O congresso barrou na semana passada a volta do voto impresso, mas com uma margem ainda muito pequena em relação aos deputados que apoiaram a medida. Seriam 79 a mais para a aprovação . Dá pra falar em um afastamento desse centro político, que gravita de um lado para o outro, do presidente Bolsonaro, ou ainda é cedo?
Eu acho que a gente tem que acompanhar, porque foi importante a derrota da Emenda Constitucional do voto impresso, era uma medida antidemocrática preparando uma iniciativa golpista dependendo do resultado da eleição. Mas o governo teve, entre os que votaram, uma maioria de votos, teve uma votação politicamente expressiva.
Foi uma vitória para o regime democrático, mas o governo não saiu enfraquecido, pois ele demonstrou uma certa força, por pressão, por campanhas, por ameaças, criando clima de terror.
Eu acho que nós temos que ficar atentos, no sentido de intensificar as mobilizações populares. É necessário aumentar a dimensão territorializada e capilaridade das manifestações e é necessário intensificar o movimento popular pelo fim desse governo, pela derrubada desse governo.
Conviver com esse governo até 2022, tendo a ilusão de que ele vai sangrando é um equívoco, é um risco muito grave, porque ele está tomando medidas para tentar ser, vamos dizer, competitivo na eleição de 2022.
A esquerda não pode ter ilusão em frente ampla, a esquerda tem que investir numa frente democrática popular, anti neoliberal, porque enquanto acontece essa crise institucional, a boiada tá passando na Câmara.
E a possibilidade dele continuar legitimado por uma eleição pode representar um risco muito grande, porque o regime autoritário produzido com o golpe de 2016 pode dar um salto de qualidade e a gente cair, aí sim, não no golpe da quartelada tradicional, mas cair no autoritarismo com grau de legitimidade, com um grau de aceitação de parcelas da população.
Um autoritarismo que vai atender a agenda do sistema financeiro, dos monopólios, a agenda do andar de cima e a situação do povo, a situação da soberania, a situação das liberdades políticas, a situação dos direitos sociais, a situação das políticas públicas tende a se agravar e a gente entrar numa situação de verdadeira barbárie, de verdadeira desconstrução de laços civilizatório.
A esquerda não pode ter ilusão em frente ampla, a esquerda tem que investir numa frente democrática popular, anti neoliberal, porque enquanto acontece essa crise institucional, a boiada tá passando na Câmara.
Veja a a a lei sobre grilagem de terras públicas, veja a lei da privatização dos Correios, já teve a privatização da Eletrobrás, veja a discussão sobre a reforma tributária que foi amesquinhada, veja a discussão sobre a lei anti-terror e veja a discussão do orçamento secreto.
Portanto, nós não podemos menosprezar esses laços que tem de um lado uma base militante de extrema-direita, por outro lado tem a Câmara dos Deputados passando a boiada, por outro lado tem os do andar de cima se beneficiando com privatizações e com o lucro dos bancos.
E por outro lado tem o caráter da burguesia brasileira ligada aos monopólios e ao sistema financeiro que, ora critica, mas não vai até os finalmente.
O senhor comentou sobre as manifestações de rua e a importância da mobilização popular para enfraquecer e continuar lutando pelo impeachment do presidente. Tivemos manifestações importantes, massivas, mas ainda fragmentadas, com conflitos entre manifestantes, principalmente de partidos mais ao centro ou à direita. Como minimizar esse tipo de animosidade? Ou é importante manter a régua ali, inclusive com quem foi fiador do golpe de 2016?
Nós temos que combinar alianças mais estratégicas, com alianças episódicas e pontuais. O que estamos fazendo na CPI da Covid é uma aliança pontual. O que fizemos no voto impresso é uma aliança pontual e o que podemos fazer para ter vacina no braço e comida no prato são alianças pontuais. Não é frente estratégica, não é frente pra governar, nem para a eleição.
Portanto, nós temos que realizar as manifestações, que elas expressem as reivindicações dos vários setores que estão indo pra rua, que ela tenha capilaridade. E ir pra rua contra o governo nós não podemos vetar. Nós não podemos discriminar A, B, ou C. Quem vai para a rua contra o governo tem que se manifestar, é uma manifestação pontual e episódica.
Sem a mobilização das ruas, sem a organização popular, a força da oposição democrática popular e antineoliberal é limitada.
Agora, o que nós não podemos abrir mão é da plataforma e de uma articulação política à esquerda na organização das manifestações, até porque essas manifestações elas tendem adquirir o conteúdo mais forte e ao mesmo tempo com uma plataforma de articulação e ela tem que se estender territorialmente, com maior capilaridade.
Sem ruas, nós não vamos derrotar o governo e suas políticas. A rua é fundamental. Nós não podemos ficar só na luta institucional, é rua e eleição, eleição e rua. Por exemplo, o resultado da CPI será muito importante se nós juntarmos com as ruas. A votação sobre o voto secreto é rua, a questão do distritão é rua, a crítica à tutela militar também é rua. Sem a mobilização das ruas, sem a organização popular, a força da oposição democrática popular e antineoliberal é limitada.
O PT precisou dar um passo atrás após o golpe de 2016. O antipetismo tomou conta do país e agora a gente vê o ex-presidente Lula voltando ao jogo político com muita força. O que o partido precisa para se preparar para 2022?
A recuperação dos direitos políticos do Lula, as manifestações de rua, alterar a conjuntura política naquilo que eu chamo de um certo equilíbrio tático, eu acho que é muito importante. O decisivo agora é 2021, não é 2022. Nós temos que intensificar a plataforma de defesa dos interesses populares e das liberdades políticas e o fim desse governo e suas políticas.
É central também a gente discutir, com base nessa plataforma, quais rumos nós lutaremos para dar ao país. A situação de destruição é profunda e ampla. O antipetismo foi cevado numa política de destruição de direitos, de garantias de políticas públicas, de controle público, de espaços democráticos.
Essa destruição veio com um antipetismo ideológico, cultural, violento como nunca tinha acontecido nos marcos de uma democracia liberal. A Constituição de 1988 foi violentada, seja pelas interpretações feitas, seja pelas emendas. Nós temos que passar uma borracha nas emendas que foram aprovadas, que destituíram inclusive bandeiras da própria democracia liberal.
Nós não temos outra saída se não a radicalização, no sentido de ir na raiz. A sangria da crise é profunda e não adianta a gente chegar com band aid e esparadrapo.
Nós temos que avançar nesta defesa de direitos, por exemplo, a plataforma da luta das mulheres contra o patriarcalismo, dos negros e das negras contra o racismo, da comunidade LGBTQIA+, da juventude que deseja esperança e o futuro dos indígenas e quilombolas.
Nós temos que construir um bloco social, político, com plataforma econômica, social, cultural, ambiental, civilizatória para enfrentar as trevas, a escuridão, o desastre e porque não dizer, a própria crise civilizatória.
É um desafio monumental. Nós não estamos falando de oposição a um governo qualquer, nós estamos falando de oposição e de derrotar um caminho, um projeto, uma articulação que tem suas vinculações com o sistema imperialista internacional, particularmente, os Estados Unidos. Não é por acaso que já vieram dois assessores, um de segurança e o outro diretor da CIA , negociar com o governo.
Eu acho que o caminho que está sendo sinalizado pela Bolívia, pelo Chile, pelo Peru é o caminho que deve sinalizar para nós na mobilização popular, na articulação à esquerda, na construção desta consistência programática. Agora, aliança não é frente, é um episódio concreto.
O senhor tem falado sobre o Partido dos Trabalhadores voltar a ser radical nas bases da sua fundação. O senhor elencou várias bandeiras importantíssimas. É possível fazer essa guinada neste momento, de um país tão polarizado, ou vai ser importante se manter mais brando, principalmente durante esse período eleitoral?
Nós não temos outra saída se não a radicalização, no sentido de ir na raiz. A sangria da crise é profunda e não adianta a gente chegar com band aid e esparadrapo. Nós temos que fazer cirurgias e mudanças mais estruturais.
Por isso o PT tem que fazer uma inflexão à esquerda, tanto nas alianças, no programa, como na mobilização popular, na sua estruturação com o povo, com a sua base militante, construindo laços mais profundos com os partidos de esquerda, com os movimentos sociais organizados, com as lideranças de esquerda, com essas manifestações que estão pipocando pelo Brasil.
Se nós não construirmos esse polo combativo à esquerda, se a gente abrandar por causa da eleição, isso é um um risco muito grande, por quê? Porque pra ganhar a eleição, nós temos que fazer uma campanha de mobilização popular, de organização do povo, com comitês, com mobilização, com energia popular.
E para governar e realizar um programa de mudança que resolva os problemas graves do povo brasileiro, também vai exigir mobilização popular.
Nós não podemos ficar limitados só à institucionalidade, nós temos que juntar institucionalidade com as ruas, nós não temos que ficar apenas nas mudanças por cima, tem que ser por baixo, nós não podemos ficar só limitados à ordem, tem que ir por dentro e por fora da ordem.
É uma nova situação, que a gente inclusive deve enfrentar levando em conta as lições, as experiências, de como nós governamos o Brasil durante treze anos.
O senhor travou uma batalha intensa com a justiça, com o STF, até ter sua pena extinta em 2015 e depois foi inocentado em 2022. As decisões do Supremo, que tem agido mesmo politicamente, não tem inclusive escondido isso, para frear os ímpetos golpistas do Bolsonaro, tem lhe preocupado? Acredita que o STF está adentrando um território perigoso? Como a democracia vai lidar com essa nova configuração do sistema judiciário?
Em primeiro lugar, eu acho que as iniciativas políticas da Câmara e do Senado estão aquem, como poder político devia ter uma postura mais ofensiva, mais ousada, mais determinada.
Em segundo lugar, eu acho que o o judiciário, particularmente o TSE e o STF, estão tomando algumas iniciativas no plano jurídico de barrar o ímpeto autoritário, o ímpeto voluntarista, o ímpeto do clima de conflito e de guerra produzido pelo atual governo. Isso é o que reflete a crise institucional.
Mas nós devemos levar em conta tudo o que ocorreu no Brasil de 2016 até agora. Nós temos que priorizar o princípio da soberania popular, de eleições livres, eleições sem manipulação, eleições sem casuísmo, diferente de 2018, para que o Brasil reinicie um processo radicalmente democrático.
Eu acho que os poderes constituídos, cada um tem seu papel. É de certa maneira, o que aconteceu com a cúpula do Poder Judiciário é que, durante um certo tempo, por ocasião do golpe, da prisão do Lula, por ocasião da eleição manipulada, houve uma condescendência com o que estava acontecendo no Brasil. Nesse sentido, eu acho que nós não podemos ter ilusões.
A reestruturação democrática das instituições do Estado deve ser influenciada pelo princípio da soberania popular, com base nos valores das liberdades democráticas, dos direitos públicos e dos direitos individuais.
A lição que a gente tira desse processo de ruptura conservadora que vem desde 2016, e por que não dizer desde o mensalão de 2005, é que esta ação da justiça de exceção, essa justiça do espetáculo, do fato determinado, do domínio do fato, com o aval da mídia e a tutela militar, é bom deixar bem claro, teve no lavajatismo o braço de vanguarda, seja em Curitiba, seja no Rio de Janeiro.
Nós aprovamos algumas leis que deram muita força para esse sistema de justiça de exceção: a Lei da Ficha Limpa, a lei da Organização Criminosa, a Lei anti-terror, a Lei das Delações e a própria lei antidrogas, que vem de antes do nosso governo.
Nós temos que fazer uma discussão democrática de mudanças no sistema de justiça, de mudança na tutela militar, de mudança no papel da PGR. A reestruturação democrática das instituições do Estado deve ser influenciada pelo princípio da soberania popular, com base nos valores das liberdades democráticas, dos direitos públicos e dos direitos individuais.
O Brasil está em uma encruzilhada, companheiro Bernardes, e esta encruzilhada começou em 2016, foi preparada em 2005, passou por 2013 e desembocou no golpe e na prisão do Lula e na eleição desse cidadão. Tem muita coisa em risco.
Para encerrar, Genoino, gostaria de falar contigo sobre o caminho que você optou por seguir após deixar o seu mandato de deputado federal. Desde então, o senhor optou por não ingressar novamente na vida política, na institucionalidade. Seguiu com tarefas de formação e conversas com as bases. É por aí que o senhor pretende seguir?
Isso que você falou é o meu caminho. Eu participei da última eleição [2010] e fiquei como suplente, fui derrotado e fui obrigado a renunciar o mandato em 2013, após a condenação injusta. E foram dois momentos que me marcaram profundamente, mas marcaram não no sentido de ficar olhando para trás, me marcaram no sentido de tirar lições, porque eu apostei tudo numa institucionalidade durante 26 anos.
Apostei muita coisa numa política de aliança, apostei muita coisa em reformar as instituições do estado, apostei muita coisa na disputa midiática que eu participava. E eu cheguei à conclusão de que isso é válido, mas sem organização popular, sem formação, sem militância organizada, sem uma compreensão radicalmente anticapitalista e em defesa do socialismo como outro modelo de organização da sociedade humana, nossa militância é restrita e limitada.
Por isso eu fiz essa opção de ser um militante de causas, um militante de razões, de sonhos e me dedicar à formação, à militância de base. Uma amiga minha disse pra mim que eu tinha que, nos momentos duros que eu vivi do Mensalão, me recuperar fazendo política sem a farda, sem a batina, sem o microfone, sem um púlpito, sem a tribuna, sem o cargo: “Seja você”. E eu estou vivendo isso, eu quero ser eu, com a minha maneira de pensar, de agir, porque eu não vivo sem a política.
Quero construir uma alternativa que represente a radicalização da democracia, que é o socialismo, da liberdade, da pluralidade, do verdadeiro humanismo, da libertação e da emancipação dos seres humanos em todos os sentidos.
A política pra mim significa liberdade, a política pra mim significa causas, a política pra mim significa não baixar a cabeça, a política pra mim significa construir um projeto coletivo e no meu modo de entender, a crise que a humanidade está vivendo, que é uma crise sanitária, uma crise social, uma crise ambiental, uma crise civilizatória, está mostrando que nós não temos que resgatar nada do capitalismo
O capitalismo está nu, mostrou sua nudez, sua perversidade, seus músculos são perversos. Quero construir uma alternativa que represente a radicalização da democracia, que é o socialismo, da liberdade, da pluralidade, do verdadeiro humanismo, da libertação e da emancipação dos seres humanos em todos os sentidos.
Eu estou comprometido com ela e quero viver uma nova experiência. Você sabe que essa é a terceira quarentena da minha vida, quase cinco anos na ditadura militar, um ano e meio na ação penal e agora. Eu aprendi a não baixar a cabeça, porque o sentido da minha vida são as causas que me movem e a humilhação é a morte.
Quando a gente luta só tem o risco de morrer, mas também tem o risco de viver com dignidade.
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