O impeachment é um momento de abalo político, diz Luís Roberto Barroso
O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou, em entrevista exclusiva aoBlog, que “a política não pode destruir o país”. Para o ministro, “o impeachment é um momento de abalo político, e é isso que nós estamos atravessando agora”. “O país vai passar alguns meses sob turbulência, com o custo que isso tem para a sociedade”, disse.
Defensor de um modelo semipresidencialista, sistema de governo híbrido que une o parlamentarismo à preservação de alguns poderes do presidente eleito pelo voto direto, ele acredita que a conveniência de fazer essa mudança agora tem que ser uma decisão da sociedade. “Trocar o pneu com o carro em movimento pode ser uma alternativa ou não. Aí já não é mais um juízo institucional, é um juízo político que eu não me sinto autorizado a fazer. Mas verdadeiramente precisamos fazer alguma coisa”.
Na última semana, o voto de Barroso foi decisivo para a definição do rito do impeachment, porque foi seguido pela maioria da Corte. O ministro nasceu em Vassouras, interior do Rio de Janeiro, mas viveu na capital fluminense a partir dos cinco anos. Em Brasília, nos últimos anos, tornou-se um dos mais respeitados advogados do país antes de ser escolhido por Dilma Rousseff, em 2013, para se tornar ministro do STF.
Quando a presidente Dilma o convidou, Barroso já tinha aceitado um convite do Instituto de Altos Estudos de Berlim, na Alemanha, e teve de desistir de dar aulas na instituição que recruta professores de várias partes do mundo para assumir no Supremo. Apaixonado pela docência, o professor Barroso demonstra isso quando o assunto é dar aulas, orientar teses de doutorado e até participar de bancas. “É o que gosto de fazer”, diz.
Isso foi comprovado em um discurso que proferiu como patrono de uma turma da UERJ, em 2015, que viralizou na internet pelo alto conteúdo emocional. Com uma visão humanista da vida, Barroso formou-se em direto na UERJ, fez mestrado na Universidade de Yale, nos EUA, voltou à UERJ para um doutorado e aos EUA para o pós-doutorado na respeitada Harvard, em 2011.
Assim que entrou na UERJ ingressou no movimento estudantil, na segunda metade da década de 1970, de 76 a 80, pós anos de chumbo, mas um período ainda de perseguição política sob o comando do general Ernesto Geisel. Barroso militou na Construção, organização de esquerda liberal com membros do Partido Comunista Brasileiro, o partidão, que não aderiu à luta armada contra a ditadura militar.
Nesta entrevista, ele trata de temas do ano de 2015, que parece não ter fim, do STF, do sistema eleitoral brasileiro, da posição do Estado na economia, da militância política de ideias contra a ditadura. Defendeu, abertamente, a legalização da maconha como um teste para descriminalização das drogas no Brasil. “Eu legalizaria a maconha”, defende. Não quis comentar as decisões do juiz Sérgio Moro, da Lava Jato, mas lembrou que elas não têm sido reformadas.
Leia e assista abaixo:
Blog – O senhor militou contra a ditadura militar no movimento estudantil?
Luís Roberto Barroso – Já era no [governo] Geisel, um período menos truculento, mas ainda muito repressivo. Nós fazíamos um pouco o movimento de empurrar a história, manter acesa a chama de uma certa consciência política que não havia. Dirigi um jornal universitário, ajudei a refundar o centro acadêmico Luiz Carpenter e fui diretor. Uma curiosidade: um dos meus adversários no movimento estudantil era o Wadih Damous [PT], que hoje é deputado federal e é meu amigo.
Blog – O senhor foi do partido?
Barroso – Nunca fui do partido, acho que, ao longo da minha vida, eu progressivamente migrei para o centro, sobretudo em questões envolvendo presença do Estado. Sou totalmente convertido à livre iniciativa há muitos anos. Acho que o Brasil tinha três grandes problemas e ainda tem dois. O primeiro grande problema, eu diria, é o patrimonialismo. Essa herança ibérica que nós temos, em que Portugal não separava adequadamente a fazenda do Rei da fazenda do Reino, e havia uma certa mistura entre o que era particular e o que era público. O Brasil foi colonizado numa cultura em que o Rei era, de certa forma, sócio dos aventureiros que vinham para fazer fortuna. A segunda característica brasileira, que tem raízes profundas, é um certo oficialismo, as pessoas dependem do Estado, precisam do Estado, querem um Estado. E o Estado gosta desse papel. A terceira vicissitude dessas três disfunções históricas é o autoritarismo. Dessa, nós estamos nos livrando, aos poucos. Nós nos livramos no plano constitucional e de algumas instituições, mas a sociedade brasileira ainda é estratificada, nós ainda somos uma sociedade hierarquizada, tanto nas relações sociais, como nas relações com o Estado. O Estado brasileiro ainda é autoritário no seu direito administrativo. É um Estado que tem dificuldade de ser transparente, de prestar informações, de dar as razões da sua conduta.
Blog – O Estado deve ser menos protagonista?
Barroso – A geração – que era a minha – acreditava no Estado como protagonista. Eu já desembarquei dessa ideia há muito tempo, mas as pessoas relutam em cortar os seus laços com o passado. Eu acho que o capitalismo e a iniciativa privada provaram-se formas melhores de geração de riqueza. De modo que eu acho que ser progressista não é interferir com a inciativa e com o capitalismo. Ser progressista é ajudar a direcionar adequadamente o produto dessa riqueza, a repartição social justa dessa riqueza e ensino fundamental de qualidade para dar o exemplo mais evidente. Mas o que aconteceu? Um país como o Brasil, com essas características, desenvolveu-se com uma economia de forte presença do Estado, onde as grandes empresas eram estatais. A iniciativa privada não era capitalizada. Ao longo da década de 30, 40, foram criadas grandes fábricas de motores, companhia hidrelétrica do São Francisco, companhia Vale do Rio Doce, todas nascidas como empresas estatais. Depois, você tem, na década de 50, a Petrobras, o BNDES. Nós passamos a ser um país em que o Estado tinha uma presença muito forte na economia. O Estado tinha uma presença muito forte em tudo. Eu acho que nós precisamos derrotar esse preconceito contra a iniciativa privada no Brasil.
Blog – É preciso mudar a cultura?
Barroso – (veja vídeo)
Defensor de um modelo semipresidencialista, sistema de governo híbrido que une o parlamentarismo à preservação de alguns poderes do presidente eleito pelo voto direto, ele acredita que a conveniência de fazer essa mudança agora tem que ser uma decisão da sociedade. “Trocar o pneu com o carro em movimento pode ser uma alternativa ou não. Aí já não é mais um juízo institucional, é um juízo político que eu não me sinto autorizado a fazer. Mas verdadeiramente precisamos fazer alguma coisa”.
Na última semana, o voto de Barroso foi decisivo para a definição do rito do impeachment, porque foi seguido pela maioria da Corte. O ministro nasceu em Vassouras, interior do Rio de Janeiro, mas viveu na capital fluminense a partir dos cinco anos. Em Brasília, nos últimos anos, tornou-se um dos mais respeitados advogados do país antes de ser escolhido por Dilma Rousseff, em 2013, para se tornar ministro do STF.
Quando a presidente Dilma o convidou, Barroso já tinha aceitado um convite do Instituto de Altos Estudos de Berlim, na Alemanha, e teve de desistir de dar aulas na instituição que recruta professores de várias partes do mundo para assumir no Supremo. Apaixonado pela docência, o professor Barroso demonstra isso quando o assunto é dar aulas, orientar teses de doutorado e até participar de bancas. “É o que gosto de fazer”, diz.
Isso foi comprovado em um discurso que proferiu como patrono de uma turma da UERJ, em 2015, que viralizou na internet pelo alto conteúdo emocional. Com uma visão humanista da vida, Barroso formou-se em direto na UERJ, fez mestrado na Universidade de Yale, nos EUA, voltou à UERJ para um doutorado e aos EUA para o pós-doutorado na respeitada Harvard, em 2011.
Assim que entrou na UERJ ingressou no movimento estudantil, na segunda metade da década de 1970, de 76 a 80, pós anos de chumbo, mas um período ainda de perseguição política sob o comando do general Ernesto Geisel. Barroso militou na Construção, organização de esquerda liberal com membros do Partido Comunista Brasileiro, o partidão, que não aderiu à luta armada contra a ditadura militar.
Nesta entrevista, ele trata de temas do ano de 2015, que parece não ter fim, do STF, do sistema eleitoral brasileiro, da posição do Estado na economia, da militância política de ideias contra a ditadura. Defendeu, abertamente, a legalização da maconha como um teste para descriminalização das drogas no Brasil. “Eu legalizaria a maconha”, defende. Não quis comentar as decisões do juiz Sérgio Moro, da Lava Jato, mas lembrou que elas não têm sido reformadas.
Leia e assista abaixo:
Blog – O senhor militou contra a ditadura militar no movimento estudantil?
Luís Roberto Barroso – Já era no [governo] Geisel, um período menos truculento, mas ainda muito repressivo. Nós fazíamos um pouco o movimento de empurrar a história, manter acesa a chama de uma certa consciência política que não havia. Dirigi um jornal universitário, ajudei a refundar o centro acadêmico Luiz Carpenter e fui diretor. Uma curiosidade: um dos meus adversários no movimento estudantil era o Wadih Damous [PT], que hoje é deputado federal e é meu amigo.
Blog – O senhor foi do partido?
Barroso – Nunca fui do partido, acho que, ao longo da minha vida, eu progressivamente migrei para o centro, sobretudo em questões envolvendo presença do Estado. Sou totalmente convertido à livre iniciativa há muitos anos. Acho que o Brasil tinha três grandes problemas e ainda tem dois. O primeiro grande problema, eu diria, é o patrimonialismo. Essa herança ibérica que nós temos, em que Portugal não separava adequadamente a fazenda do Rei da fazenda do Reino, e havia uma certa mistura entre o que era particular e o que era público. O Brasil foi colonizado numa cultura em que o Rei era, de certa forma, sócio dos aventureiros que vinham para fazer fortuna. A segunda característica brasileira, que tem raízes profundas, é um certo oficialismo, as pessoas dependem do Estado, precisam do Estado, querem um Estado. E o Estado gosta desse papel. A terceira vicissitude dessas três disfunções históricas é o autoritarismo. Dessa, nós estamos nos livrando, aos poucos. Nós nos livramos no plano constitucional e de algumas instituições, mas a sociedade brasileira ainda é estratificada, nós ainda somos uma sociedade hierarquizada, tanto nas relações sociais, como nas relações com o Estado. O Estado brasileiro ainda é autoritário no seu direito administrativo. É um Estado que tem dificuldade de ser transparente, de prestar informações, de dar as razões da sua conduta.
Blog – O Estado deve ser menos protagonista?
Barroso – A geração – que era a minha – acreditava no Estado como protagonista. Eu já desembarquei dessa ideia há muito tempo, mas as pessoas relutam em cortar os seus laços com o passado. Eu acho que o capitalismo e a iniciativa privada provaram-se formas melhores de geração de riqueza. De modo que eu acho que ser progressista não é interferir com a inciativa e com o capitalismo. Ser progressista é ajudar a direcionar adequadamente o produto dessa riqueza, a repartição social justa dessa riqueza e ensino fundamental de qualidade para dar o exemplo mais evidente. Mas o que aconteceu? Um país como o Brasil, com essas características, desenvolveu-se com uma economia de forte presença do Estado, onde as grandes empresas eram estatais. A iniciativa privada não era capitalizada. Ao longo da década de 30, 40, foram criadas grandes fábricas de motores, companhia hidrelétrica do São Francisco, companhia Vale do Rio Doce, todas nascidas como empresas estatais. Depois, você tem, na década de 50, a Petrobras, o BNDES. Nós passamos a ser um país em que o Estado tinha uma presença muito forte na economia. O Estado tinha uma presença muito forte em tudo. Eu acho que nós precisamos derrotar esse preconceito contra a iniciativa privada no Brasil.
Blog – É preciso mudar a cultura?
Barroso – (veja vídeo)
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