terça-feira, 17 de agosto de 2010

ESPECIALISTAS CRITICAM DECISÃO DO STF DE NÃO REVISAR A LEI DE ANISTIA

Representante da OAB diz que a decisão vai contra tratados de direitos humanos assinados pelo Brasil. Para ele, o caso precisa ser discutido em tribunais internacionais.

Especialistas, debatedores e deputados presentes ao 4º Seminário Latino-Americano de Anistia e Direitos Humanos foram unânimes em condenar, hoje, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) contrária a uma revisão na Lei de Anistia (6.683/79). O pedido de revisão havia sido feito pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB),
 com o objetivo de anular o perdão dado aos representantes do Estado (policiais e militares) acusados de praticar atos de tortura durante o regime militar (1964-1985).

No último dia 29 de abril, o caso foi julgado improcedente pelo STF, por 7 votos a 2.

Ao participar do seminário, o professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Pucrs) José Carlos Moreira Filho afirmou que a decisão foi um “verdadeiro equívoco”. Ele ressaltou que a Lei de Anistia foi construída durante o período ditatorial, sem levar em conta a posição dos torturados, e isso tinha que ter sido levado em conta pelo STF. “A decisão coloca o Brasil contrário à prática dos países democráticos e contrário aos tratados internacionais de direitos humanos que o Brasil ratificou”, completou.

Crime de tortura

O advogado Cláudio Pereira, representante da OAB-RJ, afirmou que a Ordem pretendia que o STF interpretasse a Lei de Anistia, de 1979, em acordo com a Constituição de 1988, que prevê o respeito aos tratados internacionais de direitos humanos.

“O principal argumento do Supremo para julgar a ação da OAB improcedente foi que a anistia foi ampla, geral e irrestrita e que os crimes praticados pelos agentes públicos eram conexos aos crimes políticos”, explicou.

Porém, segundo a Ordem dos Advogados, o direito internacional não inclui no conceito de crime político o crime de tortura cometido pelos representantes do Estado. Para Pereira, o princípio da dignidade humana, previsto na Constituição, não foi respeitado pelo STF. Ele afirmou que a luta vai continuar nos tribunais internacionais.

Poder questionado

A professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Vera Karam Chueri, por sua vez, disse que a decisão do Supremo Tribunal Federal mostrou que o STF não poder ter a última palavra em questões relativas ao direito humano e em relação à defesa da constitucionalidade. “Por que o Parlamento não reivindica para si papel igual para defender a Constituição?”, questionou.

A professora de Direito Internacional da Universidade de São Paulo (USP) Deisy Ventura afirmou que há um grande mal entendido na Corte Suprema em relação ao papel das normas internacionais. “As normas de comércio internacional são muito bem recebidas pelo direito brasileiro. No entanto, o que os tribunais brasileiros e esta Casa devem respeitar e defender é o direito internacional dos direitos humanos”.

Deisy Ventura declarou que, se a Corte de San José (a Corte Interamericana de Direitos Humanos) for coerente com a sua jurisprudência, o Brasil será condenado. Segundo ela, a jurisprudência da Corte prevê que é vedada a autoanistia, como ocorreu no caso da Lei de Anistia no Brasil.

Avanço na democracia

O deputado Luiz Couto (PT-PB) destacou que a tortura não foi crime político, e sim crime comum. Segundo ele, a luta dos torturados não deve terminar com a decisão do STF.

A presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, deputada Iriny Lopes (PT-ES), em mensagem gravada mostrada no evento, afirmou que a democracia é processo lento, construída por aqueles que anseiam por justiça. Para a deputada, as Forças Armadas são integradas por muitas pessoas que querem a democracia.

Já o deputado Domingos Dutra (PT-MA) disse esperar que o seminário possa contribuir com as discussões sobre o aperfeiçoamento da democracia no continente. “São inegáveis os avanços no campo político no nosso continente e no nosso país, mas é preciso construir uma democracia real, na qual a pobreza seja eliminada e na qual a igualdade seja um direito consolidado”, concluiu o deputado.

O 4º Seminário Latino-Americano de Anistia e Direitos Humanos está sendo promovido pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias. O evento começou ontem e segue até amanhã, no auditório Nereu Ramos.

Reportagem - Lara Haje
Edição - Pierre Triboli
Agência Câmara de Notícias

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