"Sabem que estão condenados", diz Kakay sobre Bolsonaro e cúmplices da quadrilha golpista
Advogado analisa defesas de Ramagem e Mauro Cid em envolvimento em tentativa de golpe e explica panorama juridico do julgamento no STF
Créditos: Sergio Dutti/UOL/Folhapress
Alice Andersen
Por Alice Andersen
Escrito en POLÍTICA el 10/6/2025 · 12:00 hs
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Em entrevista ao Jornal da Fórum nesta segunda-feira (9), o advogado criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, falou sobre o primeiro dia dos interrogatórios de defesa no julgamento conduzido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), envolvendo Mauro Cid e Alexandre Ramagem, acusados de tentativa de golpe de Estado. O advogado expressou surpresa com a linha adotada pelos defensores, destacando a falta de uma discordância da ocorrência do crime.
Conhecido por sua longa trajetória na defesa de réus em cortes superiores, Kakay destacou a particularidade dessa fase processual. Questionado sobre sua percepção do desenrolar do julgamento, afirmou ter acompanhado de perto a fase dos interrogatórios e explicou a diferença crucial entre o depoimento de uma testemunha e o de um réu no processo penal brasileiro.
"O interrogatório é a única fase no processo penal brasileiro em que o réu tem fala. Ele faz a própria defesa, né? Todo o tempo do processo, quem produz a defesa são os advogados, a defesa técnica", disse.
O criminalista ressaltou que, enquanto a testemunha é obrigada a responder sobre fatos de seu conhecimento, o réu no Brasil tem o direito de não produzir provas contra si e pode, inclusive, mentir. "É muito difícil você ver o interrogatório de um réu que seja absolutamente importante para poder absorver a pessoa. Por quê? Porque o réu vai pra lá falar que é inocente mesmo, essa é a regra."
Sobre o depoimento de Mauro Cid, que é delator no processo, Kakay avaliou que foi “técnico, muito bom e bastante razoável para a manutenção” da delação. Ele minimizou episódios como o nervosismo do réu ao ser questionado sobre o uso de redes sociais, dizendo que, para o conjunto probatório, isso é “zero relevante”.
O criminalista observou um clima de tensão entre os advogados de defesa:
“Todo mundo sabe de que os clientes estão condenados agora. Espero que eles tenham feito bons honorários iniciais e não honorários de êxito”
A apatia observada entre os defensores está ligada à força das provas e à dificuldade de sustentar teses de inocência diante de fatos já consolidados, segundo Kakay. “O que mais me impressionou até agora é que eu não vi nenhum daqueles advogados ali, alguns com bastante experiência, alguns chegarem lá e partirem pra cima do Ministério Público pra dizer que isso é um absurdo, é uma falácia, uma interpretação absolutamente marginal."
"Oito advogados assumiram a tribuna, nenhum negou o crime. Nenhum advogado sentou lá e falou, isso é um absurdo, não houve crime, isso é uma falácia, meu cliente é inocente, porque o crime não ocorreu. Nada. O que eles fizeram foi, com respeito todo que tem pela advocacia, na ampla defesa, foi tentar mostrar que, de alguma forma, a pessoa que ele tava defendendo não participou do ato em si"
Para ele, muitos profissionais têm dificuldade em assumir a defesa de acusados em casos tão sensíveis, especialmente quando há um viés democrático envolvido.
“É difícil você advogar num momento deste do Brasil, em que quase tivemos um golpe, e você advogar sendo um democrata e pegar e subir na tribuna do Supremo Tribunal, que foi depredado, que o relator falou não era pra soltar as demais autoridades, mas você ficaria preso, que tinha um golpe pra matar, pelo menos o presidente da República e o ministro supremo, que tinha uma tentativa de fechar o Supremo Tribunal, como é que você vai assentar?”
Kakay trouxe à tona um caso de experiência própria. "Não estou criticando, só comentando. Desde o primeiro momento, nós optamos no escritório por não pegar nenhum, ninguém que está envolvido de 8 de janeiro, ninguém. Fomos procurados por empresários, no momento X específico, exatamente porque eu sei que eu não poderia fazer essa entrega visceral pra causa."
Ainda refletindo sobre a postura dos advogados na tribuna do STF, ele relembrou casos em que alguns defensores tentaram adotar uma linha mais agressiva, mas perderam o tom técnico: “Teve momentos nesse processo em que certo advogado chegou a dizer que os ministros do Supremo eram os mais odiados do Brasil. Nenhuma técnica, entendeu?”
Condenação é certa
A previsão é que as penas para os líderes da organização criminosa possam chegar a até 32 anos de prisão, considerando o volume e a gravidade das provas, de acordo com Kakay. “O processo penal que tá sendo feito nesse núcleo social, ele é abundante de provas que foram encontrados em computadores, em telefones, provas testemunhais, ou seja, o processo está cumprindo o rito democrático normal do processo penal democrático.”
"É importante acompanhar esses interrogatórios agora, até porque o cidadão está no desespero, sabe que até meio de agosto ele vai estar condenado a 30 anos, provavelmente cadeia, 28, 30, 32. Porque, veja bem, se o cara que estava lá fazendo a bucha de canhão, tentando ajudar o golpe, foi condenado a 14, porque são cinco crimes, pena menor em cada um, somado em concurso dá 12, 14, 16, você imagine agora onde estão os líderes da organização criminosa", observa.
O julgamento em curso de todos os golpistas é um momento singular no país, tanto pela importãncia histórica para um país marcado por golpes ao longo de sua história quanto pela defesa diante da justiça mais alta do país.
“Você vai assumir a tribuna do Supremo e o golpe é fechar o Supremo. Entendeu? Talvez venha daí a sua perplexidade”, completou o advogado